quarta-feira, 30 de abril de 2008

Ele não conhece o Brasil real

Senhor Tarso Genro, reconheço a sua intelectualidade, mas o senhor é por demais teórico e pensa que todos os brasileiros comungam com a sua ideologia política. Desde o dia em que o senhor traiu a confiança do porto-alegrense, manifestando a sua ambição política pelas glórias do poder, entregando a Prefeitura a alguém que não recebera um voto sequer para administrá-la, ficou patente que não se pode levar muito a sério as suas ideologias ou argumentações.Estamos numa democracia em que a liberdade respeitosa de manifestação ainda é livre, isto é, se o PT não alterar a regra do jogo, já que faz de tudo para tapar a boca da imprensa, porque ela incomoda segmentos sombrios de pessoas e governos falaciosos. Por isso, e a par de seu artigo O Brasil da mídia e o Brasil real, venho fazer alguns comentários. O ex-presidente português Mário Soares, por acaso, percorreu o verdadeiro Brasil das periferias, das favelas, das malocas, dos mocambos, das palafitas, dos moradores de ruas, dos desempregados, dos sem-teto, dos sem-terra, das entidades indígenas abandonadas, dos sem-assistência-médico-hospitalar da rede pública, dos presos jogados nas cadeias superlotadas, dos oprimidos pelos narcotraficantes e pela falta de segurança pública nacional. Viu que os cidadãos não têm mais segurança na liberdade de ir e vir e poder estar dentro de sua casa sem que sejam molestados, assaltados ou mortos pela bandidagem que tomou conta do País e que põe em risco até a integridade dos turistas estrangeiros, que não sabem se regressarão com vida a seus países de origem.E o descaso das autoridades públicas de saúde com os serviços sanitários preventivos levou o Brasil à epidemia da dengue. O Rio de Janeiro hoje sofre as piores conseqüências. Ou apenas foram apresentados ao ilustre visitante as estatísticas convenientes de um País não verdadeiro e os lugares aprazíveis das ribaltas planálticas brasilienses, das alterosas terras mineiras e da efervescente paulicéia? Tenho muita dúvida de sua assertiva de que o líder português tenha constatado a existência de duas "realidades" bem distintas, porque todo aquele que mora no Brasil, descompromissado com qualquer vertente política e partidária, tem testemunhado o dia-a-dia de dificuldades do povo e as falcatruas políticas, que são blindadas pela cúpula governamental em defesa de seus apaniguados amigos. O Brasil verdadeiro, cuja moeda tem faces desiguais, não pode ser omitido ou escamoteado de ninguém. E os 10 milhões de empregos prometidos nos quatro anos de governo? Bem, de 2003 a novembro de 2007 foram criados 6,6 milhões com carteira-assinada. Bravo! Muito bravo! Mas não eram 10 milhões em quatro anos? É ter muito topete para pretender realçar o crescimento do emprego, enquanto todos sabemos que a população desempregada continua aumentando. O salário mínimo teve aumento real de 46,7%. Os senhores não têm que governar de forma revanchista e olhando para trás para explorar o que os outros não fizeram. Dar dignidade salarial ao trabalhador é um dever de todos os governos, e não uma bondade de quem quer que seja. O que se arrecada com impostos no País, sem a contrapartida de prestação de serviços públicos de qualidade, só obriga o governo a remunerar condignamente o trabalhador. Mesmo que discorde, mas a verdade é uma só: o País teve a sorte, neste período governamental, de não experimentar nenhuma crise no cenário internacional que viesse interferir na economia brasileira. Logo, com uma atmosfera favorável, o Brasil tinha o dever de crescer muito mais. E com a economia já estava sob controle no governo anterior, bastaram algumas pinceladas de ajustes para reduzir a vulnerabilidade externa e aumentar as nossas reservas internacionais. "Ora (direis) ouvi estrelas! Certo, perdeste o censo!" São fragmentos da poesia de Olavo Bilac para mostrar-lhe o quão o nobre intelectual defende cegamente o governo Lula ao afirmar, de forma categórica, não ver a sua conivência com a corrupção política. Apenas para rememorar, o senhor parece que anda um pouco esquecido. O presidente Lula havia afirmado a uma jornalista, na França, que sabia dos caixas dois dos partidos políticos, e evidentemente do caixa dois do PT. Pois bem, se ele sabia, na condição de presidente da República, por que não tomou as devidas providências para a sua moralização? Foi preciso que das entranhas da podridão política emergisse o ex-deputado Roberto Jefferson, com o seu traseiro ardendo na fogueira, para botar a boca no trombone e denunciar o mundo-cão que enlameava, principalmente, o partido dos trabalhadores e a sua cúpula política.Não fosse assim, tudo estaria como dantes nas terras de Abrantes e o PT e o governo não seriam desmascarados, expondo o falso pudor de sua decantada vestal. Por isso, hoje 40 “aliladrões” estão dependurados nas barras do STF, porque enxovalharam a imagem política brasileira. Dizer também que a Polícia Federal, neste governo, aumentou a caça aos crimes de colarinho-branco parece uma insinuação inglória e rasteira de pretender achar que a briosa Polícia Federal seja um órgão de orientação do governo, o que não é verdade. A Polícia Federal é um órgão de Estado (Art. 144-CF), sem nenhuma vinculação política, e o senhor, melhor do que ninguém, sabe disso, embora o governo faça as suas interferências indevidas. Sucede, todavia, que o recrudescimento de notícias publicadas na imprensa – que, aliás, presta um grande serviço investigativo à sociedade, denunciando o envolvimento de políticos indecorosos e demais coadjuvantes em falcatruas ou operações ilegais – levou aquela instituição a fazer o seu dever de casa com mais intensidade. O líder português Mário Soares conhece o grau de cultura política do povo brasileiro? Ele sabe que a maioria do povo aquém-mar, destas terras descobertas por Cabral, jamais ouviu falar dos famigerados cartões corporativos que cobrem os gastos supérfluos do presidente da República e demais indecorosos políticos e funcionários? Ele sabe que aqui uma ex-ministra da Igualdade Racial do governo cometeu improbidade administrativa no exercício de suas funções públicas, com o uso indevido do cartão corporativo, e não foi demitida e punida na forma da lei? Ele sabe que aqui as pesquisas são manipuladas? Quem, com toda a franqueza, já foi algum dia pesquisado por esses institutos ou conhece alguém de sua relação que já tenha sido pesquisado? Ele sabe que as pesquisas não consultam o bolsão de miseráveis, desempregados e sem lares, formado por crianças, jovens e velhos, que vivem na mendicância, dormindo ao relento amontoados nas calçadas, sob marquises e viadutos, portas de edifícios e casas comerciais, nos bancos de praças públicas etc? Cuja indecência social, esquecida por este governo já no seu segundo mandato, cresce assustadoramente em todas a cidades e capitais brasileiras? Ele também sabe que o governo administra o País por medidas provisórias e que a Constituição Cidadã é alterada, sistematicamente, ao gosto dos interesses políticos governamentais? Claro que não sabe! Então, ele não conhece o Brasil real. O governo vibra com os resultados positivos da economia. Todos nós também. Mas a bandeira das conquistas sociais defendidas pelo PT, que alçou Lula ao Planalto, até agora não tremulou para amenizar o estado do abandono, crescente, das pessoas carentes em todas as cidade e capitais brasileiras. Nunca se viu tantas pessoas miseráveis e sem lares perambulando "sem lenço e documento" pelas cidades. Por que cresce a mendicância de rua, no Brasil, em pleno segundo mandato deste governo? Julio César Cardoso é bacharel em Direito e servidor federal aposentado

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