sábado, 12 de março de 2022

VIDAS INTERROMPIDAS

 



DESDE A MADRUGADA DE 24 DE FEVEREIRO, quando as tropas de Vladimir Putin invadiram a Ucrânia, em inaceitável agressão, o mundo vive de sobressaltos. Há atenção especial aos movimentos bélicos, aos passos diplomáticos e às necessárias sanções econômicas contra o agressor. Um capítulo, para além das bombas, das mesas de negociação e dos sistemas de transações financeiras, merece acompanhamento ainda mais próximo: o da tragédia humanitária. Os dados são estarrecedores. De acordo com levantamento da agência da ONU para refugiados, o ACNUR, na semana passada, doze dias depois do início do conflito, pelo menos 2 milhões de ucranianos — boa parte de crianças que deixaram os pais para trás — tinham saído do país a caminho de abrigos na Polônia, Romênia e Moldávia. “É a crise de refugiados de crescimento mais rápido na Europa desde a II Guerra Mundial”, disse o italiano Filippo Grandi, comissário do ACNUR. As guerras nos Bálcãs, na Bósnia e em Kosovo, nos anos 1990, também provocaram um enorme fluxo de degredados, entre 2 milhões e 3 milhões de pessoas, mas em um período de oito anos.No início, cidadãos da Ucrânia procuraram abrigo com parentes que viviam fora. Nos últimos dias, o drama se multiplicou, com a fuga em desespero, sem perspectivas nem portos seguros. Para seguir de perto esse movimento tristemente histórico, VEJA contou com o trabalho minucioso da jornalista ucraniana Anna Romandash, de 29 anos. Ela mora em Lviv, cidade de 700?000 habitantes próximo da fronteira com a Polônia, palco de aglomerações em busca da diáspora. Nomeada “embaixadora para a liberdade de imprensa na Ucrânia”, Anna se dedica a denunciar os abusos contra os direitos humanos no Velho Continente. Recentemente, ela ganhou um prestigiado prêmio do Instituto Europeu do Mediterrâneo por suas reportagens. Não haveria, portanto, voz mais adequada para filtrar as informações do coração da guerra em seu aspecto mais delicado.É vergonhoso, no século XXI, tempo no qual as democracias comprovaram ser o único modo sensato e coerente de sistema de governo, saber que a sanha autoritária e expansionista de Putin conduza o mundo ao horror, com vidas interrompidas, mortes e famílias destruídas. O voto popular que levou o presidente russo ao Kremlin não significa autorização para fazer o que bem entender, perseguindo adversários políticos, calando seus opositores e infligindo dores e tragédias a pessoas absolutamente inocentes em outro país. As imagens e histórias dos refugiados traduzem, de forma definitiva, uma mensagem: não há justificativa para essa guerra. Infelizmente, ela acontece como reflexo de uma personalidade malévola, com claros traços de psicopatia.

Boa leitura,Mauricio LimaDiretor de Redação de Veja

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