Colunista do UOL
A influenciadora bolsonarista Karol Eller foi encontrada morta, nesta quinta (12), no prédio onde morava, em São Paulo. Ela postou mensagem no Instagram indicando que tiraria a própria vida, pedindo desculpas, mas afirmando que "perdeu a guerra". O boletim de ocorrência da Polícia Civil indica suicídio.
Antes de mais nada, toda a solidariedade a seus amigos e familiares neste momento.
E antes que uma guerra ideológica se estabeleça sobre sua morte, vale lembrar algo repetido por profissionais que atuam nesse tema: o suicídio ou sua ideação raramente têm uma única causa. Normalmente, contam com vários motivos - nem sempre fáceis de serem identificados. E falar da depressão é apenas parte da questão.
Por ser figura pública, este caso pode ajudar a
iluminar a importância de estarmos atentos ao sofrimento dos que nos rodeiam,
mantermos abertos canais de escuta e acolhimento, criarmos estruturas públicas
para atender a esse tipo de demanda e darmos centralidade à questão da saúde
mental.
Buscar
entender o que aconteceu pode ajudar outras pessoas. Por trabalhar com
plataformas digitais, ela passava boa parte do tempo no ambiente tóxico de
redes sociais e aplicativos de mensagens da área de política. É consenso entre
profissionais de saúde o impacto negativo que esse ambiente produz no médio e
longo prazos na vida de quem está nele imerso.
Além
disso, ela vivia em conflito com sua sexualidade. No mês passado, afirmou que
havia se convertido e deixaria de ser lésbica. "Que diminua eu, para que
tu cresças, Senhor, mais, mais. Renúncia! Sim, eu renunciei à prática
homossexual, eu renunciei vícios e renunciei os desejos da minha carne para
viver em Cristo", postou.
Nas redes
sociais, após a informação de sua morte, muitos passaram a culpar a chamada
"cura gay", série de práticas desenvolvidas por autodenominados psicólogos
e por algumas igrejas para tentar reprimir o desejo homoafetivo.
Em
dezembro de 2019, havia sido agredida quando estava com a namorada em um
quiosque na orla da Barra da Tijuca, quando recebeu apoio de bolsonaristas e da
população LGBT+.
E houve
outras mudanças recentes em sua vida. Eller participou dos atos golpistas em
Brasília, motivo pelo qual foi demitida da EBC, onde tinha um cargo por
indicação. Logo depois, foi contratada como assessora do deputado Paulo Mansur
(PL) na Assembleia Legislativa de São Paulo.
O quanto cada isso contribuiu ou quais as outras razões desconhecidas? Difícil saber.
A sociedade equivocadamente culpa a pessoa e também
sua família e seus amigos pelo que ocorre nesses momentos. Ela, como se fosse
uma covarde. Eles, como se tivessem contribuído para isso. Um ato sádico. Na
verdade, a primeira é vítima de uma dor profunda, para a qual não vê outra
saída que não seja a morte. E acreditem: a família e os amigos de verdade já se
culpam por si só pensando o que poderiam ter feito.
O cuidado com a saúde mental é a diferença entre a
vida e a morte em uma sociedade que impõe e cobra obediência a padrões
inalcançáveis, que chama a crítica ao bullying de bobagem, que dita com quem
você deve ser relacionar e que monitora 24 horas por dia e 7 dias por semana o
comportamento via redes, cancelando sumariamente diante de qualquer "deslize".
Mas podemos ser práticos. Tanto a pessoa com
ideação suicida quanto sua família precisam de suporte, de atendimento
especializado. Infelizmente, muita gente, incluindo médicos de outras
especialidades, ainda tem preconceito contra a psiquiatria, seus tratamentos e
seus remédios.
Terapia para ajudar a entender a si mesmo,
acompanhada por um profissional capacitado, ainda está distante da maioria da
população. Seja por preconceito, por falta de conhecimento, por falta de
estrutura, pessoas acabam sofrendo e morrendo em silêncio.
Precisamos de acesso facilitado aos tratamentos de saúde mental no SUS,
incluindo hospitais com retaguarda psiquiátrica para atender emergências (e de
um SUS com recursos materiais e humanos para a tarefa), precisamos de escolas
com a presença de psicólogos preparados para atender crianças e adolescentes e
precisamos de uma sociedade que acolha ao invés de excluir, que entenda ao
invés de julgar. E não encare como frescura o sofrimento alheio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário